40 adolescentes apreendidos poderão deixar centros socioeducativos por falta de espaço no Ceará
A unidade cearense em situação mais crítica é o Centro
Educacional São Francisco (CESF), cuja capacidade é de 60 internos, mas admite,
atualmente, 105 meninos. — Foto: José Leomar/SVM
Dos dez centros socioeducativos estaduais localizados em
Fortaleza e na Região Metropolitana, no Ceará, oito estão superlotados, sete
deles com ocupação superior a 119%. Caso não haja vagas em outras unidades para
receber os internos excedentes, segundo determinou o Supremo Tribunal Federal
(STF) em maio deste ano, cerca de 40 adolescentes da capital terão os casos
reavaliados pelo Sistema de Justiça e, de acordo com o critério do Juiz da 5ª
Vara da Infância e Juventude, podem receber uma progressão de medida.
Conforme decisão do STF, equipamentos que estiverem
ocupados acima de 119% devem transferir os internos para outros locais. No
Ceará, isso deve acontecer até esta quarta-feira (12), segundo estima o juiz da
5ª Vara da Infância e da Juventude de Fortaleza, Manuel Clístenes.
Se não houver unidades em condições de recebê-los,
determina o STF, a Justiça local deve converter as medidas em internações
domiciliares. No Ceará, porém, os critérios para desafogar as unidades foram
estabelecidos nesta segunda-feira (10), após reunião da Superintendência do
Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo (Seas). O órgão informa que não
há, no momento, casos para internação domiciliar – mas Clístenes avalia que
será necessário.
"Teremos algumas pessoas que vão ter a medida
progredida e outros que vão para internação domiciliar esperar surgir uma vaga
para entrar no sistema", esclarece. O cometimento de atos infracionais sem
violência, o bom comportamento durante a medida socioeducativa e o tempo de
internação nos centros, segundo o juiz, serão os critérios para definir quem
sai e quem fica.
A progressão - ou substituição, termo mais adequado para o
contexto atos infracionais cometidos por adolescentes - é o resultado da
reavaliação da medida, feita pelo juiz da 5ª Vara da Infância e Juventude em um
período de até seis meses. O processo pode alterar o cumprimento para
semiaberto, aberto ou até extinguir a medida socioeducativa, de acordo com o
comportamento do interno.
A unidade cearense em situação mais crítica é o Centro
Educacional São Francisco (CESF), cuja capacidade é de 60 internos, mas admite,
atualmente, 105 meninos – totalizando uma taxa de ocupação de 175%. Em seguida,
os Centros Educacionais São Miguel e Patativa do Assaré, que têm a mesma
quantidade de vagas, aparecem com 89 e 88 adolescentes admitidos, totalizando,
respectivamente, 148,3% e 146,7% de ocupação. Os dados são da última
sexta-feira (7) e foram fornecidos ao G1 por Manuel Clístenes.
Dois centros ainda dispõem de vagas e receberão a demanda
excedida, que soma cerca de 26 adolescentes. Segundo o magistrado, é necessário
deixar 30 vagas ociosas. "Não podemos deixar o sistema com o número
fechado de vagas. Nessa hipótese, aqueles jovens que depois venham a cometer
atos graves ficariam sem condições de entrar", aponta Clístenes.
Prioridades
Conforme a Seas, é preciso criar novos fluxos de prioridade
para internação, para priorizar o ingresso de infratores com atos mais graves
nos centros e liberar os menos graves ou com mais tempo nas unidades. Uma
resolução com as normativas será publicada. A Superintendência afirmou, ainda,
que o Ceará "não terá um grande impacto com a determinação" do
Supremo, pois desde a criação, em 2016, "o Tribunal de Justiça e o Governo
do Estado vêm implementando medidas para adequação das sentenças, de acordo com
a Legislação vigente. Nos últimos três anos, segundo a Seas, em nota, houve uma
redução de quase 30% no número de adolescentes internados.
Realocação
Para a defensora pública do Núcleo de Atendimento ao Jovem
e Adolescente em Conflito com a Lei (Nuaja), Luciana Amaral, a internação domiciliar
é a última medida a ser considerada para solucionar o problema da superlotação.
"É possível fazer uma realocação dos internos dentro dos próprios centros,
porque alguns não excedem a capacidade total. Além disso, podemos reavaliar o
cumprimento da medida nos casos de adolescentes que cometeram atos sem
violência ou grave ameaça - não são muitos, mas existem. Quanto à internação
domiciliar, vamos oficiar a Superintendência e a 5ª Vara para verificar a real
possibilidade", pontua.
Reorganizar os centros socioeducacionais em estrutura e
administração "é muito urgente", independentemente da decisão
federal, como alerta Luciana. "Centros voltados a medidas provisórias
recebem adolescentes em definitivo, porque eles não cabem nos outros. Está tudo
misturado. Os meninos deveriam ser divididos até por compleição física, e
alocados em unidades próximas à residência, por determinação do Sinase (Sistema
Nacional de Atendimento Socioeducativo), mas isso se torna inviável".
Nesse contexto desestruturado, o sistema falha no objetivo
principal: ressocializar. "Algumas atividades ficam inviabilizadas. Por
serem de facções, os meninos não podem ficar juntos, têm de ser divididos em
turmas, e devido à grande quantidade deles e ao número insuficiente de socioeducadores,
eles acabam passando muito tempo ociosos nos dormitórios. Isso dificulta a
mudança de paradigma para eles".
G1 CE