Senado derruba decreto das armas e impõe derrota ao Governo
Plenário
do Senado analisou projeto que susta o decreto das armas,
que foi derrubado pela maioria dos senadores - Foto: Agência Senado
que foi derrubado pela maioria dos senadores - Foto: Agência Senado
Por 47 votos a 28, o plenário do Senado decidiu nesta
terça-feira (18) derrubar os decretos do presidente Jair Bolsonaro (PSL) que
flexibilizam o porte e a posse de armas no Brasil. A decisão ainda tem que
passar pela Câmara. O tema deverá tramitar em regime de urgência, indo direto
para o plenário. Não há, porém, prazo para a votação.
Se também for derrotado na outra Casa, o governo cogita
recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal) por entender que o PDL (projeto de
decreto legislativo), votado nesta terça para sustar o decreto, é
inconstitucional por interferir no mérito da norma editada pelo Executivo.
Mesmo assim, quando questionado o que faria se fosse
derrotado, Bolsonaro respondeu nesta terça: "Eu não posso fazer nada. Eu
não sou ditador, sou democrata, pô".
A validade do decreto também é questionada em três ações
que serão analisadas na Suprema Corte no próximo dia 26.
O decreto das armas foi editado por Bolsonaro em 7 de maio.
Sob pressão do Legislativo e. do Judiciário, o presidente recuou 15 dias depois
e fez alterações no texto que flexibiliza as regras sobre o direito ao porte de
armas e munições no país, editando um novo decreto.
A segunda versão da medida proibiu que cidadãos comuns
portem armas de fogo como fuzis, espingardas e carabinas, permissão que havia
sido criticada por especialistas em segurança pública.
Bolsonaro e senadores de viés armamentista fizeram pressão
nas redes sociais nas últimas horas e o presidente fez reiterados apelos de
viva voz.
"Não deixem esses dois decretos morrerem na Câmara ou
no Senado. A nossa vida é muito importante. Vocês sabem o quanto é difícil
produzir neste país e a segurança tem que estar acima de tudo", disse o
presidente a plateia formada por parlamentares e produtores agrícolas e
integrantes da bancada ruralista em evento no Palácio do Planalto.
"Toda boa ditadura é precedida do desarmamento. Você
vê: o povo venezuelano não tem como reagir. Se tivesse não estaria acontecendo
tudo isso que está acontecendo lá", afirmou horas depois.
A sessão no Senado teve um intenso debate entre senadores
contrários e favoráveis à proposta, refletindo o clima tenso que vem desde a
quarta-feira passada (12), quando a CCJ (comissão de Constituição e Justiça) da
Casa rejeitou os decretos.
"Criei meus filhos sem dar um tiro sequer. E morava na
minha propriedade rural sozinha com três crianças. Senhor presidente da
República, arme e treine os policiais. Pagamos impostos para que o Estado
brasileiro cuide de nós. Não transfiram a obrigação de vocês, governo federal,
para o povo brasileiro", disse a senadora Kátia Abreu (PDT-TO).
O senador Luiz do Carmo (MDB-GO) disse que sua filha foi
assassinada porque não estava armada.
"Eu tenho certeza absoluta de que, se alguém, dentro
dos critérios estabelecidos, tiver posse de uma arma e souber usar, os bandidos
vão correr, porque o Estado não está dando garantia para o cidadão, não
deu", afirmou.
Filho do presidente da República, o senador Flávio
Bolsonaro (PSL-RJ) disse que o decreto serve para "salvar vidas".
"Vamos falar para a mulher que está sendo estuprada,
que ela pode tacar um livro na cabeça do estuprador e não dar um tiro para
defender sua vida e sua integridade física", disse Flávio.
"Entendo que um pai ou esposo de uma senhora estuprada
queira matar com as próprias mãos aquele que fez esse mal, mas nós, como Estado
brasileiro, não podemos pretender enfrentar o crime com a mesma arma do
criminoso: a violência e, eventualmente, a covardia", disse Jaques Wagner
(PT-BA).
Nos últimos dias, houve uma intensa campanha nas redes
sociais. O próprio Bolsonaro foi à internet pedir pela manutenção de seu
decreto, manifestação que não foi bem recebida por senadores contrários ao
decreto que, no dia anterior, revelaram terem recebido ameaças por causa da
maneira que votaram na CCJ.
Pela manhã, governistas diziam que ainda havia expectativa
de derrota, embora ela tivesse diminuído nos últimos dias. Defendendo que o
resultado seria sabido apenas na hora, um aliado de Bolsonaro disse esperar que
o vencedor tivesse cerca de 8 votos a mais que o derrotado.
Na semana passada, na CCJ, o relatório do senador Marcos do
Val (Cidadania-ES), favorável ao decreto, foi rejeitado por 15 a 9. Com a
derrota, foi aprovado o voto em separado do senador Veneziano Vital do Rêgo
(PSB-PB), que é contra a medida de Bolsonaro.
Técnicos da Câmara e do Senado emitiram pareceres que
indicavam que, nos dois decretos, Bolsonaro extrapolou limites legais,
distorcendo o Estatuto do Desarmamento em vários pontos e exorbitando o poder
regulamentar do Executivo.
Entre outros pontos, os técnicos apontaram que o decreto
extrapola seu poder regulamentar ao estabelecer uma presunção absoluta de que
todas as 20 categorias que lista cumprem requisito básico para andarem armadas.
O texto em vigor aumenta a lista de munições de uso
restrito no país, incluindo de canhões e de morteiros, e restringe rojões,
foguetes, mísseis e bombas.
O prazo para informar à Polícia Federal e ao Comando do
Exército a aquisição de armas de fogo também foi ampliado. Ele passou de dois
para sete dias úteis após a aquisição do aparato.
A medida ainda especifica quantas armas de fogo podem ser
adquiridas por colecionadores, caçadores e atiradores e por integrantes das
Forças Armadas, limites que não tinham sido previstos.
Ela detalha a validade do registro do porte de armas em dez
anos, período que não havia sido especificado na medida anterior, e estabelece
que será a Polícia Federal quem expedirá a autorização para a prática
esportiva.
Além disso, a iniciativa também expandiu as categorias consideradas
de atividade de risco e que, portanto, têm direito ao porte, incluindo guardas
portuários e integrantes do Ministério Público.
Na área rural, ela restringiu a autorização do porte de
armas, estabelecendo que será concedida apenas para proprietários de imóveis
que se dedicam "à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal,
florestal ou agroindustrial".
Senadores disseram que há no senado um projeto que trata de
porte de arma em áreas rurais que tramita na Casa e pode ser pautado para
resolver esta questão.
Fonte:
Diário do Nordeste