Ministério da Saúde suspende contratos para fabricar 19 remédios de distribuição gratuita
Manifestantes encenam "cabo de guerra" entre
pacientes e indústria farmacêutica na porta do INPI, em agosto de 2018. - Foto:
Paula Giolito/ABIA
O Ministério da Saúde suspendeu, nas últimas 3 semanas,
contratos com 7 laboratórios públicos nacionais para a produção de 19
medicamentos distribuídos gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Documentos obtidos pelo jornal O Estado de S. Paulo apontam suspensão de
projetos de Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDPs) destinados à
fabricação de remédios para pacientes que sofrem de câncer e diabete e
transplantados. Os laboratórios que fabricam por PDPs fornecem a preços 30%
menores do que os de mercado. E já estudam ações na Justiça.
Associações que representam os laboratórios públicos falam
em perda anual de ao menos R$ 1 bilhão para o setor e risco de desabastecimento
- mais de 30 milhões de pacientes dependem dos 19 remédios. A lista inclui
alguns dos principais laboratórios: Biomanguinhos, Butantã, Bahiafarma, Tecpar,
Farmanguinhos e Furp.
Além disso, devem ser encerrados contratos com oito
laboratórios internacionais detentores de tecnologia, além de laboratórios
particulares nacionais. Isso porque cada laboratório público, para desenvolver
um produto, conta com dois ou três parceiros. Depois, esses laboratórios
públicos têm o compromisso de transferir a tecnologia de produção do
medicamento ao governo brasileiro. Essa lista inclui referências da indústria
como a GlaxoSmithKline Brasil Ltda. (GSK) e a Libbs, além de Oxygen, Nortec,
Biomm, Cristália, ITF, Axis e Microbiológica Química e Farmacêutica Ltda.
Transitório
Procurado, o Ministério da Saúde informou que as PDPs
continuam vigentes. Segundo a pasta, foi encaminhado aos laboratórios um ofício
que solicita "manifestação formal sobre a situação de cada parceria".
O órgão federal ainda informou que "o chamado 'ato de suspensão" é
por um período transitório", enquanto ocorre "coleta de
informações".
O jornal, porém, teve acesso a um dos ofícios em que o
ministério é categórico ao informar o encerramento da parceria. O documento, do
dia 26 de junho, é assinado por Denizar Vianna Araujo, secretário de Ciência,
Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde. a Bahiafarma é informada
que, com base em um parecer da Advogacia-Geral da União e da
Controladoria-Geral da União, "comunicamos a suspensão da referida PDP do
produto Insulina Humana Recombinante Regular e NPH, celebrada com a Fundação
Baiana de Pesquisa Científica e Desenvolvimento Tecnológico, Fornecimento e
Distribuição de Medicamentos e solicitamos manifestação formal da instituição
pública quanto à referida decisão, no prazo improrrogável de dez dias
úteis".
O presidente da Bahiafarma e da Associação dos Laboratórios
Oficiais do Brasil (Alfob), Ronaldo Dias, disse que os laboratórios já estão
tratando as parcerias como suspensas. "Os ofícios dizem que temos direito
de resposta, mas que a parceria acabou. Nunca os laboratórios foram pegos de
surpresa dessa forma unilateral. Não há precedentes", afirmou.
Consequências
O entendimento da associação de laboratórios é que a
entrega de remédios já programada continua garantida. Isso significa que não
deve haver interrupção imediata no fornecimento.
Segundo ele, a maior parte pretende fazer um questionamento
jurídico. "A primeira medida que a gente pretende tomar é no âmbito
judicial. Nossa linha deve ser alegar a arbitrariedade da forma que isso se
deu."
Já o representante de um laboratório de São Paulo, que
falou com o Estado sob a condição de não ter o nome divulgado, disse que a
suspensão das parcerias vai criar um problema de saúde e afetar uma cadeia
econômica "imensa", expondo o Brasil à insegurança jurídica.
Ele cita como exemplo uma planta industrial no valor de R$
500 milhões, construída em uma parceria de um laboratório privado com o
Instituto Butantã e financiada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
e Social (BNDES). "Essa planta toda fica obsoleta. Toda cadeia econômica
está severamente afetada", disse.
'Desmonte'
O presidente da Bahiafarma e da Associação dos Laboratórios
Oficiais do Brasil (Alfob), Ronaldo Dias, vê retrocesso para a indústria
nacional de medicamentos e um risco para a saúde de milhões de pacientes. O
laboratório é um dos que tiveram seus contratos suspensos. "É um
verdadeiro desmonte de milhões de reais de investimentos que foram feitos pelos
laboratórios ao longo dos anos, além de uma insegurança jurídica nos Estados e
entes federativos. Os laboratórios não têm mais como investir a partir de
agora. A insegurança que isso traz é o maior golpe da história dos laboratórios
públicos."
O representante do setor destaca que as Parcerias para o
Desenvolvimento Produtivo (PDPs) também funcionam como um regulador de preço no
mercado. Ele explica que a Bahiafarma, por exemplo, vende insulina a um preço
três vezes menor que laboratórios estrangeiros. Dias ressalta que um processo
de compra de medicamento no Ministério da Saúde costuma demorar até 11 meses
para ser concluído. Por isso, haveria até risco de desabastecimento. As
informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Diário
do Nordeste