Pelos registros, o Estado saiu de um acumulado de 541 mortes por Covid-19 em janeiro para 1.020 em fevereiro e 2.442 em março, até o dia 29. - Foto: Kid Junior
O número de mortes por Covid-19 no Ceará entre 1º de
janeiro e 29 de março de 2021 extrapola em mais de cinco vezes o acumulado de
homicídios no Estado no mesmo período. De assassinatos, segundo a Secretaria da
Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), foram 779, número que está
decrescendo a cada mês. Já de óbitos pela infecção, conforme o IntegraSUS, da
Secretaria da Saúde (Sesa), foram 4.003 registros, e a tendência é aumentar.
Pelos registros, o Estado saiu de um acumulado de 541
mortes por Covid-19 em janeiro para 1.020 em fevereiro e 2.442 em março, até o
dia 29. Já os homicídios, incluídos nas estatísticas de Crimes Violentos Letais
e Intencionais (CVLI), saíram de 306 em janeiro para 250 em fevereiro e 223
também até o mesmo período.
ÓBITOS E IDH
Com a Covid-19 também é possível estabelecer relação
direta entre óbitos e IDH. Segundo o boletim epidemiológico divulgado no último
dia 26 de março pela Secretaria da Saúde de Fortaleza (SMS), os maiores
acumulados de mortes desde o início da pandemia foram nos bairros Barra do
Ceará (160), Mondubim (147), José Walter (136) e Vila Velha (135). De acordo
com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), esses bairros têm
IDHs de 0,19, 0,23, 0,40 e 0,27, respectivamente. Índices considerados altos
são acima de 0,8.
O sociólogo Adriano Almeida acompanha as estatísticas de
violência urbana e da Covid-19 nos territórios periféricos da Capital. Segundo
ele, que é conselheiro do Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza e associado
ao Ponto de Memória e ao Comitê Popular de Enfrentamento à Covid-19 do Grande
Bom Jardim, embora os dados deste ano apresentem tendência de redução, os CVLIs
têm aumentado ao longo da pandemia, bem como a infecção tem se mostrado cada
vez mais letal em bairros de baixo IDH como os do Grande Bom Jardim.
Estamos vivendo duas epidemias simultaneamente.
Aprendemos a naturalizar os CVLIs e, agora, estamos aprendendo a naturalizar as
mortes por Covid-19”
ADRIANO
ALMEIDA / Sociólogo
Como prováveis causas para a alta dos óbitos pelo novo
coronavírus nesses espaços, Adriano cita ausência do Estado com aporte de
serviços públicos, baixa escolaridade dos habitantes e duas tendências
negacionistas, sendo uma de ordem sociocultural e a outra fundamentalista.
Por isso, o sociólogo acredita ser essencial que o poder
público trace estratégias de enfrentamento à Covid-19 diferenciadas em cada
bairro. “A política pública, num contexto de pandemia, precisa se atentar para
o conceito de que a cidade é desigual. Isso é básico”, diz.
Em constante diálogo com pastas governamentais, o
representante comunitário cita conquistas importantes recentes, como a
descentralização dos pontos de vacina contra a Covid-19 e a busca ativa por
estudantes da rede pública e seus familiares com pendências vacinais e de
cadastro em programas sociais do Governo.
MOVER
DO GRUPO DE RISCO
Mesmo não sendo possível comparar estatisticamente os
óbitos por Covid-19 com os homicídios, a epidemiologista e professora da Universidade
Federal do Ceará (UFC), Caroline Gurgel, concorda que a pobreza é um
denominador comum entre os dois eventos.
Contudo, a especialista defende que esse fator pode ser
movido para tirar a população dos territórios periféricos da mira da
mortalidade pela pandemia.
“As pessoas que têm menos condição nutricional, que vivem
num ambiente com menor IDH, são mais vulneráveis não somente à Covid como,
também, a vários outros eventos em saúde. Você pode dar a essas pessoas o
suficiente para que elas saiam dessa característica: um alimento adequado, uma
água potável, uma renda pra que consigam se manter em casa, no distanciamento
social. Tem outros meios de remover essa população do grupo de risco.
Diferentemente da condição de ser idoso, de ter uma comorbidade”, analisa
Caroline.
Diário
do Nordeste
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